E terminei a primeira revisão!
Para o bem ou para o mal, foi a revisão mais rápida que alguma vez fiz, e nem foi por me ter apressado - voou debaixo dos meus dedos!
Cortei alguma coisa, pouco acrescentei. Agora só volto a pegar-lhe depois de ter tido notícias da editora! Outras virão, talvez com valentes alterações, mas para já parto para outra revisão, a do A Chama ao Vento, com a barriga cheia... e não é só porque acabei agora mesmo de almoçar (o que também é verdade). Ehehehe. *Mum joke*
Ficam alguns parágrafos do Dançarina, um cheirinho apenas da história...
O início do capítulo 2.
O início do capítulo 2.
Foi uma sacudidela mais brusca, as
rodas saltando nalgum buraco ou pedra dos que minavam a estrada de terra, que
despertou César. Abriu os olhos com um sobressalto, sentou-se muito direito,
sacudindo outra vez contra a porta, e engoliu uma exclamação de pavor.
- Está tudo bem. Aqui há mais buracos,
foram as granadas… mas já foi há muitas semanas – disse-lhe o condutor, a voz
rolando de trás do bigode como um pequeno trovão. – O senhor adormeceu.
A constatação embaraçou César. No
início da viagem, espreitava a estrada e os campos como se, a qualquer momento,
um batalhão alemão pudesse sair de debaixo do chão. Não se apercebera do
momento em que a exaustão o arrastara, suprimindo o medo e a curiosidade, e o
fingimento deixara de sê‑lo, nem sabia quanto tempo teria dormido, com a cabeça
caída sobre o peito, sacolejando ao sabor das irregularidades do pavimento e
dos protestos da viatura. Esfregou o pescoço rígido e espreguiçou-se
discretamente, sentindo as dores que lhe tolhiam os movimentos. Fora
chacoalhado e sovado desde Dover e o corpo queixava-se como se tivesse seguido
numa velha carruagem dias a fio.
- Estamos quase a chegar, daqui a
pouco já consegue ver o Hospital. Ambleteuse é depois. – informou Jacques –
Aqui pela costa, como vê, não corre perigo. Só dos buracos ou de algum coelho
que o assuste.
César preferiu ignorar a provocação. Estava
demasiado cansado e ansioso e imaginava que parecesse um pouco louco, com a sua
urgência em vir meter-se no lugar de onde todos gostariam de escapar-se. A
sorte, porém, devia estar do lado dos loucos, porque ali estava, incólume e já
muito perto de Ambleteuse. Pagaria ao homem de acordo com o combinado e isso
era o suficiente, os seus motivos, ainda que nada tivessem de secretos, eram só
seus. Não sentia necessidade de justificar-se. Olhou em volta e para cima, para
o céu onde agora o sol brilhava alto, entre nuvens que o iam cobrindo a espaços
irregulares. Não via o mar, mas pressentia-o próximo, no brilho e na textura do
ar. Devia passar do meio dia e eles continuavam a rolar entre campos onde, aqui
e ali, se adivinhava a intenção de uma plantação, rectângulos de milho ou
batata, mas que era, na sua maioria, terra inculta a perder de vista. César
conseguia imaginá-la antes da guerra, verdejante no mês de Abril, prometendo
fartura onde agora só haveria fome. Fome e morte. Ao fundo, do seu lado, um
celeiro em ruínas e um casebre sem porta e quase sem telhado denunciavam a
passagem das tropas.
Voltou-se para trás, curioso, e
vislumbrou a torre semi-destruída de uma igreja, erguendo-se um pouco acima de
um corpo de pedra antiga, que talvez tivesse sido bonito antes de lhe serem
arrancadas duas paredes. Em seu redor, jaziam as ossadas de uma aldeia, meia
dúzia de casas escuras, onde talvez já só vivessem algumas mulheres, crianças e
velhos, talvez ninguém. De algumas restavam apenas escombros, uma parede, um
monte de pedras, um improvável vão de porta. Quanto tempo teria a destruição,
uma semana e meia como a batalha que o touxera ali, um mês, um ano? Quanto
tempo seria necessário, quando por fim a guerra terminasse, como terminavam
todas, para fazer renascer a terra, as aldeias… quantas delas nunca mais
voltariam a ser habitadas como dantes?
- Já cá estamos. – anunciou Jacques.
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