Tenho umas quantas razões para não estar em idílio perfeito com a escrita. Corrigo: com a publicação. É preciso distinguir uma coisa da outra com muita clareza: a escrita não me entristece, é uma catarse, um prazer, uma necessidade, a publicação é sempre uma incógnita, porque depende de muitos factores, da minha vontade, das decisões da editora, do mercado, das vendas, etc, etc, e traz-me tantos prazeres como dissabores.
Os últimos livros que escrevi e publiquei, sobretudo O Ano da Dançarina, foram trabalhosos do primeiro ao último dia, um labor intenso de pesquisa, escrita, conjugação entre facto e ficção, edição, revisão, correção... Neste momento, tendo em conta os resultados mais recentes (os números, não as opiniões, que parece que não batem certo, opiniões excelentes e números que... enfim), tenho mais perguntas do que respostas. Estou consciente de que esta honestidade pode não me favorecer, mas há momentos em que é, ao menos, libertadora. Não vou fingir uma indiferença que não tenho nem entendo, porque, como tenho dito muitas vezes, quem escreve pode fazê-lo só para si, mas quem publica não. Quem publica, quer ser lido (muito lido, muito, muito lido) e ter quem goste e, porque não, quem deteste o seu trabalho. Logo, tanto as opiniões como o número de leitores que adquirem e/ou leem o livro importa. Representam o sucesso do romance e do autor e muitas vezes o seu futuro.
Dito isto, o romance que estou a escrever neste momento sabe-me ao paraíso. Há muitas razões:
Primeira, não requer nenhuma pesquisa. Os meus livros publicados são todos de época, históricos, se quiserem. Sou exigente comigo própria na conjugação da História com a história, para que tudo seja fluido e nada chatinho, para que nunca seja uma lição, mas ainda assim se descubra a época, para que o retrato seja fiel, cheio de detalhes engraçados, sem ser doutrinário, e isso dá uma trabalheira inimaginável. Muito mais difícil, acreditem, do que espetar com os factos nas páginas, em parágrafos e parágrafos que parecem tirados ds compêndios de História, o que é uma tentação a que nuca cedo. Este romance, porém, não é de época e, se preciso que um ou outro facto bata certo com o que digo, é coisa mínima, mais do lugar do que do tempo. Coisa fácil, portanto, facílima. e de grande liberdade. Tanta, tanta, que até sou capaz de escrever a qualquer hora do dia, eu que há anos só sou capaz de fazê-lo de manhã, com a cabeça fresca!
Segunda, porque escrevo o que me apetece. Tenho uma ideia geral do que será esta história, de quem são as personagens e o que fizeram ou farão, mas ela flui como bem quer, sem uma linha cronológica, sem nenhuma obrigação. Não tenho um esquema ou plano - ao contrário do anterior, que exigiu uma tabela detalhada - o que quer dizer que a qualquer momento posso ser surpreendida por qualquer das personagens. Talvez a coisa terrível tenha sido feita, não pela personagem a quem agora a atribuo, mas por outra. Talvez a minha protagonista fique em Portugal, talvez não. Sei lá. Nem tenho ainda um fim definido, nem estou certa do que sucederá no próximo capítulo. Nem sei se a terminarei, mas uma coisa sei: será curto, menos de 200 páginas. Se calhar. menos de 150. Nisso, estou determinada.
Terceira, porque não faço ideia do que lhe farei quando... se o terminar, porque não sinto essa obrigação. Não sei se tentarei a minha actual editora, que me tem como escritora de históricos, se o colocarei num envelope para um prémio qualquer (pelo desafio, que me importa, sei bem como é isto dos prémios), se o deixarei bem quietinho no seu ficheiro, bem escondidinho, se o imprimirei apenas para os amigos, que ão uns queridos e querem sempre ler o que vou fazendo. As dúvidas costumam ser: será que a editora o quer? Será que, se não quiser, encontrarei outra interessada? Desta vez, pouco me importa. Uma parte da indiferença poderá advir de um certo desapontamento, mas a maior parte de ser um livro diferente dos anteriores e não ter expectativas para ele, por não ser provável à partida, que a editora o queira. Deva ficar com pena? Pois. Sei lá. Entretanto, dei-lhe o título provisório (ou não) de Limões na Madrugada, por causa de um poema que escrevi há tempos e está por aqui no blogue, poema medíocre mas que deixou semente.
São motivos mais do que suficientes para que escrever este romance, seja um prazer, no sentido em que a liberdade absoluta é um prazer.
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