Há muito tempo que tinha este livro na estante e na lista informalísima e inconstante de livros que não podia deixar de ler um dia. Até já lhe tinha pegado algumas vezes, sem lhe dar início, mas, por uma ou outra razão, acabava por escolher outras leituras. Não conhecia a escrita de Lídia Jorge e parecia-me essencial conhecê-la.
Desta vez, foi pega de caras. Ou de cernelha, talvez, porque comecei indecisa, e li as primeiras páginas indecisa. Não sou apaixonada pela escrita rebuscada que modela a pontuação à sua vontade, colocando pontos finais a meio das frases, para transformar uma frase em duas, três, quatro, ou que utiliza metáforas sobre metáforas ou expressões que forçam uma certa entoação poética (a "cintura dos joelhos"), e todas essas coisas acontecem neste livro. Não foi o primeiro que li com estas características, mas não me faz apreciá-las mais.
Por isso - ou apesar disso - este foi um livro que primeiro estranhei e depois deixei entranhar-se. O livro cosntitui uma curiosa crónica da vida rural nos últimos anos da ditadura (foi curioso chegar ao 25 de Abril no livro mais ou menos a 25 de Abril), em que se sentem bem os efeitos isoladores do êxodo e emigração, e está imbuído de sentimento humano, no que tem de melhor e pior, e de um certo realismo mágico - ou crendice popular - feito de prodígios, adivinhações, sonhos e memórias. A forma diluiu-se no conteúdo e acabou por dar-lhe força, sobretudo ao utilizar as expressões e modos de falar populares, e a leitura acabou por ser um estranho prazer. Acabei por aperceber-me de que já lera uma cena, da agressão aos cães da aldeia, que é para mim horrenda. Foi a única que, sabendo o que me esperava, passei adiante.
Não estou certa de ter ficado totalmente rendida a Lídia Jorge, apesar de ter gostado particularmente do seu desenho das personagens, mas fiquei decerto convencida a repetir a autora.
Sem comentários:
Enviar um comentário