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segunda-feira, 26 de junho de 2017

fast burners ou long runners?

Todos nós, leitores, temos uma noção mais ou menos clara de que há livros de consumo rápido, de fácil digestão e olvidáveis, outros que ficam connosco muito tempo e outros ainda que, com a sua capacidade de permanecer e representar, pertencem ao espólio literário de um país - ou da humanidade. Que se tornam clássicos. 

Não vou fazer juízos de valor, nem tentar estabelecer aqui os padrões de uma coisa e de outra. Sendo os clássicos uma categoria aparte, porque são-no independentemente do agrado ou desagrado com que possam ser lidos, a verdade é que um livro pode ser olvidável para um leitor e memorável para outro. Nada disso é relevante para mim, que leio com gosto quase tudo o que me vem parar às mãos, até rótulos de champô, se se der a necessidade.  

Esta publicação é sobre uma outra ideia que me deixou a magicar. 

Há pouco tempo, fui colocada perante um conceito que não me tinha ocorrido, e que está menos relacionado com a nossa posição enquanto leitores, do que com a forma como um livro vai penetrando e encontrando o seu lugar junto do público. Como vende, portanto. Um autor que muito admiro, a propósito de mais uma edição do seu livro, comentou que não esperava o impacto imediato desse livro: esperava que tivesse melhor desempenho ao longo do tempo, do que de início, ou seja, que fosse um long runner. Não sei se usou esta expressão, mas é a que me ocorre quando penso nisso. 

É muito interessante, e pôs-me a pensar sobre os livros em geral. Ocorreram-me outras expressões. Há livros que são fast runners. Tomam a dianteira de repente e vendem muito num instante, uma, duas, muitas edições. Alguns destes gastam-se depressa, independentemente da qualidade. Não são maratonistas. No caso deste autor, felizmente, o livro tem-se mostrado ao mesmo tempo as duas coisas: ao fim de imenso tempo, continua a vender bem, num mercado bastante miserável como é o nosso. 

Há outros, porém, que nem uma coisa, nem outra. São fast burners, ardem um pouco, mas a chama apaga-se depressa, sem ter causado grande impacto. É o que sucede, creio, à maior parte dos livros que vão sendo publicados por cá, a não ser que recebam o oxigénio de um prémio, da exposição pública de quem o escreveu (de preferência anterior à publicação) ou de uma ligação ao pequeno e fechado universo literário nacional, ou de algum outro acontecimento extraordinário. Ou da sorte, claro. Não questiono a qualidade, que devia ser essencial para o sucesso de um livro (nem sempre é, infelizmente), apenas o facto de por vezes isso não ser suficiente. Os livros traduzidos parecem chegar de fora com duas botijas de oxigénio: a primeira, o já terem habitualmente algum reconhecimento antes de cá chegarem; a segunda, a confiança e curiosidade dos leitores portugueses - maior com o que vem de fora do que com o que se faz cá dentro. 

Não me importa agora o que, para além da qualidade ou falta dela, faz com que um livro seja um corredor rápido, outro um corredor de fundo e um outro mal ter pernas para andar. Achei piada à ideia, mais ainda aos nomes "em estrangeiro" que me ocorreram. Que me perdoe quem achar tudo isto um disparate.  Há dias assim. 




1 comentário:

Cristina Torrão disse...

Não é disparate nenhum, achei muito interessante.
E acrescento que algo semelhante se passa com os próprios escritores. Há escritores que criam um impacto enorme com o primeiro livro, mas, depois, não conseguem igualar. Como se tivessem gasto tudo (inspiração, talento, etc.) nessa primeira obra bombástica.
Outros vão crescendo devagarinho. Quase não se dá por eles, no início, mas vendem, depois, cada vez mais.
E também há aqueles que, independentemente da qualidade, nunca chegam a dar nas vistas.