Paro o carro junto ao passeio e noto que chegam aos poucos. Saem sem vontade dos automóveis, abrem porta, até logo, fecham porta. Arrastam os pés pelo caminho, sozinhos, reunindo-se pelo caminho em
pequenos grupos. Vêm outros acompanhados de pai ou mãe, avó, avô, um adulto que os vai
empurrando, sempre em passo mais rápido do que o deles, com pressa de estar mais adiante, o tempo mais velho, mais medido, mais curto para o que ainda se
deseja e nunca há de chegar a ser feito. O meu abre a porta, até logo, fecha-a, segue a passo de caracol, faço pisca, alinho-me com os outros automóveis, espero. Há uma passadeira atulhada. O meu lá vai.
Observo enquanto o rádio debita anuncios porque não tenho mais nada para fazer. Não quero vê-los, é de manhã, o dia espera e já estou impaciente. A turba incomoda-me. São diferentes uns dos outros, eu
sei, mas o costume fá-los indistintos, a mesma altura os pequenos e os grandes,
o mesmo peso do sono e da rotina que nos espera a todos a fazê-los fechar o rosto, arrastar os pés metidos nos
ténis e botas mal atados, os mesmos jeans e calções, os mesmos cabelos
compridos e curtos, os mesmos bonés e hoodies
e gorros. O que me pertence também já atravessou, segue com os outros e de
repente não o vejo. Sei que está lá mas não lhe distingo as pernas das outras pernas,
a cabeça é de outro qualquer ou de ninguém, enquanto se afasta de mim e já não
é meu mas desse outro mundo em que estamos os dois, suspensos em lados opostos da
fronteira do dever e haver.
Mesmo à minha frente, na
passadeira, uma empurra outro, rapariga e rapaz riem-se os dois, um diz um palavrão. Quase são diferentes por um instante, quase podiam sê-lo nesse mar
de expressões neutras, se não me puxassem com tanta força a corda da irritação. Todos puxam em uníssono, sem darem sequer por mim. Ainda é cedo para tanto cansaço de estar, tarde de mais em mim para absorver a energia
com que daqui a pouco vão contaminar o meu ar e o seu futuro. Impaciento-me. Não devia.
Esta é a minha gente de uma forma e de outra.
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