Cerra-se a porta do labirinto do Cemitério dos Livros Esquecidos.
O Labirinto dos Espíritos fecha uma saga familiar e literária, ou, como diz o autor-personagem, "um romance em quatro tomos", que inclui A Sombra do Vento, O Jogo do Anjo e o Prisioneiro do Céu, ordem pela qual os livros foram publicados e os li. Está escrito algures nestas páginas que num livro não há início nem fim, só entradas e saídas, e que os quatro tomos, como quem os leu entende bem, não têm uma ordem específica. De facto, não é obrigatório lê-los todos, nem por uma ordem de publicação, embora exista alguma sequência. Eles ligam-se sobretudo através de personagens, acontecimentos, pelo cenário de uma Barcelona labirintica e obscura (e, neste, também de uma Madrid muito negra) e sobretudo pelos omnipresença dos livros... da literatura, o que é neste caso o mesmo.
Esta última parte da história, "virulentamente longa" (palavras do autor-personagem), reune "todos os perfumes das anteriores" e mostra as saídas do labirinto, embora não sem antes nos mergulhar nas suas sombras mais negras, as da Espanha do franquismo, com os seus crimes e perseguições, polícias secretas, corrupções a ambições, mas também as de uma certa fantasia gótica, que se arrasta de livros anteriores, e em que realidade (ficcionada) e alucinação perdem os contornos e quase se fundem. Os segredos mais feios são desvendados e selados os destinos de personalidades que se foram antevendo e às quais nos acostumamos nos tomos anteriores.
As personagens são cruas e falhas, por vezes feias, mas também muitíssimo literárias, no sentido em que todas parecem tocadas por um rasgo de dramatismo e encerram mistérios e segredos, e pícaras, como é o caso do fantástico Fermín, que continua a fazer sorrir, com as suas filosofias e tiradas, a sua personalidade de toureador sem arena e os seus Sugus. O Cemitério não existiria sem ele. *wink* Alicia Gris, motor para esta história, apresenta uma deliciosa ambiguidade, que faz dela quase um exemplo de femme fatalle de film-noir, mulher elegante e fria de pistola no bolso do casaco, profunda, anjo e demónio em simultâneo, destinada a, de uma ou de outra forma, desaparecer na bruma sem ter pertencido a nada, nem ninguém.
Demorei muito a terminar, não porque me faltasse a vontade de lê-lo, mas porque me faltou o tempo e o livro é longo.... longo... longo, mas cada sessão deliciosa de leitura se prolongou tanto quanto me foi possível e o fim fica comigo. Não é inesperado, mas isso pouco importa, quando a chave com que o autor o trancou é a certa, e os últimos parágrafos me deixaram pousar o livro com uma sensação de consolo. E ainda bem que foi assim, porque, em geral, perco-me um pouco nos livros muitos longos e acabo por distanciar-me mais da história do que gostaria e temia terminar insatisfeita.
O fechar desta história coloca cada personagem onde é natural que esteja, com os seus fins e recomeços. Nem todos os livros o exigem, claro, alguns há que suportam muito bem, exigem até, um fim em aberto. Outros pedem que se precipite histórias e personagens do cimo de um abismo - o que aqui podia ter acontecido, sem choque. Não seria, porém, tão satisfatório para mim.
Ficou-me a vontade de voltar a Barcelona, no Inverno, com menos turistas, sem pressas e com um roteiro "zafoniano" na mão. E de reler os dois primeiros livros, à luz deste. Ficaram adiadas ambas as coisas, a próxima viagem é a Florença, e há demasiados volumes por ler na minha pilha.
Uma nota menos boa: talvez por ter passado agora pelo processo intensíssimo de revisão do Dançarina, e estar ainda assim, cheia de receio de gralhas e erros, reparei em várias gralhas, mas sobretudo em inúmeras falhas de síntaxe e de concordância... Num livro desta qualidade, parece-me que, apesar da extensão, devia ter havido um trabalho mais aturado...
2 comentários:
Não vejo a hora desse livro ser vendido no Brasil. A história deve ser interessante e creio que muitos mistérios serão revelados.
Toda a série é fantástica. Este não fica atrás...
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