Antes de mais, devo dizer que comprei este livro numa feirinha escolar e é uma versão antiga, já amarelada. Esperava, portanto, que viesse lido e relido. Não vinha. Vinha era, à maneira dos livros antigos, por "abrir", ou seja, em cadernos fechados em cima ou lateralmente, que foi preciso cortar, com o maior cuidado, com um X-ato. Foi um engraçado jogo de paciência, mas confesso que nem sempre fui pefeitamente sucedida, por isso li-o um nadinha rasgado aqui e ali, em cima ou de lado.
A minha experiência anterior com o autor limitava-se ao O Adeus às Armas, que é um livro de guerra, a Segunda, se não me engano, lido há já muitos anos. Este, Por Quem Os Sinos Dobram, é provavelmente o seu título mais conhecido e mais conceituado. Peguei nele, porém, sem nenhum ideia do conteúdo. Sabia, é claro, que Hemingway amava Espanha, por onde andou, os costumes, o espírito do povo espanhol, as touradas, etc, e tinha ideia de que se tinha envolvido de alguma forma na guerra civil. Infelizmente, desconheço quase completamente o contexto dessa guerra, a não ser que envolveu um golpe militar, comunistas e fascistas e conduziu, em última instância, ao regime fascista ditatorial de Franco. Os detalhes da luta, porém, escapam-me, e por isso, sendo este um livro essencialmente sobre a guerra civil, tive sempre a impressão de que me faltava qualquer coisa para entender o que se passava.
A personagem central é um jovem americano, Robert Jordan, envolvido até ao pescoço na guerra civil. Ele é dinamitista e enfurna-se no campo espanhol, atrás das linhas inimigas, com a missão de fazer explodir uma ponte. A auxiliá-lo, terá um bando partisan, de camponeses e outras gentes simples, incluindo um cigano e um antigo toureiro (ou algo parecido) e uma jovem sobrevivente de cabeça rapada, Maria, que esteve nas mãos dos fascistas e foi resgatada pelo bando. Tudo se passa no curto espaço de menos de quatro dias, entre a chegada de Jordan e a explosão da ponte, e as páginas estão repletas de narrações de episódios das vidas das personagens, ilustrativos das suas características, ou de momentos terríveis da guerra vividos ou protagonizados por elas. Estas cenas e as personagens são marcantes, sobretudo Pilar, e o que de melhor a história tem. Há uma profundidade subtil no despudor com que o autor as desnuda, às personagens e às cenas terríveis de agressão na guerra, para mostrar o que de melhor e de pior elas têm e o que a raiva e o medo fazem aos homens. Ao mesmo tempo, o amor reveste-se de uma ingenuidade desesperada, quase infantil, iludida, que é quase comovente e nos assegura, desde o início, que estamos perante Romeu e Julieta e não há nenhum futuro ali.
A leitura, feita em na semana de férias, na praia, à beira da piscina, teve momentos de fascínio e outros, menos, de alguma impaciência, quando desejava que a acção avançasse e as personagens se detinham mais uma vez em considerações deslumbradas sobre touros e touradas, etc. Detesto tourada e aqui o deslumbramento por ela, pelos touros de morte e respectivos matadores é muito claro. Aprendi alguma coisa sobre a guerra civil espanhola, quanto mais não seja que preciso de informar-me. Descobri no fim, com certa surpresa, que me ligara mais do que julgava às personagens e, embora o esperasse, me custou o desfecho. Fiquei ainda com a impressão de que seria um tanto autobiográfico, perdoe-me quem sabe imenso sobre Hemingway e sobre esta obra, se digo um disparate. E perdoem-me se é outro disparate, mas tenho melhores recordações de O Adeus às Armas, pelo que a minha valorização deste texto é mais intelectual do que emocional, como acontece com outros, aos quais reconheço a qualidade, sem que me tenham trazido um deleite indiscutível.
Uma nota: tenho grandes suspeitas de que a tradução não é perfeita e o texto está cheio de gralhas, o que reforça a minha ideia de que se dava menos importância a isso há uns anos.
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