A revisão d'A Grande Mão já vai a meio. Até terminar, vou publicar de quando em quando um excerto do texto revisto. Estes são os primeiros parágrafos, que já uma vez aqui deixei sem revisão.
A capa aqui ao lado é provavelmente provisória...pode ser que eu aprenda a trabalhar com o photoshop!
Divirtam-se!
Nolan puxou as suas redes pela
terceira vez nessa manhã, olhou para elas e soltou um palavrão irritado.
- Vazias outra vez!- exclamou,
observando o único peixinho que apanhara, uma coisinha insignificante que
se debatia para libertar o corpo luzidio das malhas que o prendiam.
Suspirou, olhando para o animal e sentindo-se, por um momento, tão enrodilhado
como ele. Não gostava de pescar nem sabia fazê-lo, mas a tarefa fastidiosa
cabia-lhe, dia sim, dia não. Franziu o sobrolho ao peixe. - Tu não tiras
a fome a ninguém, bicho. Vai à tua vida.
Desembaraçou o animal dos nós, com
um suspiro resignado, e devolveu-o à água. Nunca ficava com o que não se
pudesse comer, era matar sem razão. Sentou‑se,
pesado, sentindo a pequena vida formigar nas pontas dos dedos e a pedra a pulsar-lhe
junto ao peito, suspensa do gasto cordão de cabedal velho onde a trazia. Era
sempre assim, esse cansaço, quando lhe passava pelas mãos a decisão sobre a
vida ou a morte. Ao esmagar inadvertidamente um inseto, ao poupar a vida a um
pardal, ou sempre que a sua flecha trespassava o coração de um cervo inquieto
ou a pele dura de um javali. Sentia o sangue do bicho correr-lhe nas veias, e a
pequena pedra trabalhada, cujas inscrições não compreendia, aquecia até quase
lhe queimar a pele. Sentia a energia que emanava, sem
saber como nem porquê. Nem de onde vinham a pedra ou a percepção da vida e da
morte.
Inspirou
fundo e voltou a lançar as redes, prometendo que era a última tentativa nesse
dia. Que nulidade era na arte
irritante da pesca!
-
Arte! Só o idiota do Tullock é que pode achar que isto é uma arte!
Pensou nele, à cata de raízes e frutos, e em Ianca, entediado, escondido numa moita qualquer,
vigiando descuidadamente a sua presa. Preferia estar no seu lugar, agachado e
imóvel, franzindo os olhos para aguçar a visão, seguir as passadas incertas de
algum javali... quando o animal parasse para fuçar no chão, à procura de alguma
raiz suculenta, esticaria a corda do arco até vibrar entre os seus dedos,
encheria o peito... quase podia sentir o cheiro a terra, e depois o bater do
coração da pequena besta no seu, quando ela se apercebesse da sua presença. A
flecha soltar‑se‑ia, cortaria o ar com um assobio único, e o seu próprio coração
susteria a batida por um segundo, não mais do que isso, enquanto a vida se
esvaziava do corpo do animal. Ianca não se aperceberia desse momento precioso.
Caçaria a sua presa e desmanchá-la-ia, arrancando primeiro a flecha da carne
macia, sem um lamento, sem uma prece. Para Nolan, caçar era ao mesmo tempo
prazer e dor. Gostava da excitação, da perseguição, mas o ato de matar
trazia-lhe sofrimento.
- Já chega. -
decidiu, espreitando o magro produto da sua pescaria - Chega.
pag. 5-6
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