Páginas

domingo, 8 de janeiro de 2017

O Prisioneiro do Céu - Carlos Ruiz Záfon

Resultado de imagem para o prisioneiro do céuQuando li A Sombra do Vento e O Jogo do Anjo, não conhecia Barcelona. A presença da cidade é tão poderosa e omnipresente em todas as suas páginas, que temos a impressão de que nada do que aqui se passa podia suceder noutro lugar. Tive a impressão de que perdia por não conhecer a cidade, que imaginei obscura, prenhe de mistérios e com um fascínio próprio. Não se concretizou por inteiro quando por fim, cheia de entusiasmo, a visitei. Encheu-se de turistas (como eu, claro), de ruído, e, mesmo com as suas ruelas a prometer mistérios, senti-me roubada deles ao correr como uma louca de um ponto turístico para outro. Preferia deambular. Parar nas esplanadas. Respirar a cidade. Talvez não seja boa turista. Nenhum dos livros já lidos perdeu o encanto por isso, como não perdera no momento da leitura, apesar de sentir uma certa confusão espacial, por não saber ao certo que tipo de ruas seriam aquelas, numa cidade tão intrincada. 

Ao ler O Prisioneiro do Céu, que talvez seja até mais simples e menos misterioso do que os livros anteriores (creio que tenho de relê-los em breve), pude acrescentar o reconhecimento de alguns lugares ao prazer da leitura de Zafón, que é exímio com ambientes e personagens, até as ausentes, ou quase, com o ritmo e a narrativa. Foi muito engraçado saber onde estavam, quando passavam pela Calle (na verdade Carrer) Hospital ou entravam no Mercado de la Boqueria, andavam pela Via Layetana ou pela Calle Condal, muito perto da qual estive instalada (na Carrer d'Estruc). Ou, claro, pelas Ramblas, lugar absurdo hoje em dia, de tão apinhado, mas que terá sido uma bela avenida um dia. 

As páginas voam. Quando lhe peguei, sem ter bem a certeza de me apetecer ler nesse momento, desapareceram logo 100 páginas. De uma assentada. De uma assentada. Só assim.

Quem leu este, provavelmente leu os anteriores. E sendo assim, que sobra ainda para dizer sobre Fermín (que não é o prisioneiro do céu, perdoem-me o "spoiler", mas é centralíssimo aqui), Daniel Sempere, o seu pai, Bea, David Martín, outros? Neste livro, porque o presente o exige, temos uma retrospectiva sobre uma parte negra da história de Fermín, e com ela mais um segmento obscuro e revoltante do franquismo. As características rocambolescas desta personagem e a forma como se expressa fizeram-me sorrir nos piores momentos, sorrir perante a degradação do espaço e do corpo, perante a dor, a enfermidade, a agressão, a injustiça, a tirania, a morte. Não encontrei grandes vestígios  da espécie de realismo mágico que dá cor às páginas do outros dois volumes, mas, embora goste muito desse artífico, não senti falta dele aqui. No fim, ficam mistérios (reais) por resolver e questões a encerrar, espero, no Labirinto dos Espíritos, que recebi como prenda de Natal, e portanto já me espera.  

Uma nota de desagrado: num livro tão bem escrito, há gatos como este... "entre a mamã e o Martín só os unia uma amizade..." (que tal "entre a mamã e o Martín só havia uma amizade" ou "a mamã e o Martín eram unidos apenas pela amizade"? Tantas hipóteses, sem absurdos gramaticais) Infelizmente, há vários deste género. Serão fruto da tradução?

Sem comentários: