e quem desabafe com o(a) melhor amigo(a), quem tome comprimidos, quem faça exercício, quem apanhe uma boa bebedeira, enfim, há milhares de maneira de libertar a tensão e reequilibrar o espírito.
Eu escrevo.
E porque é assim, não escrever deixa-me de mau humor. Se for porque não tenho tempo ou estou demasiado cansada, como tem acontecido, pior ainda. Fico deprimida, com a autoestima de rastos, qualquer brisa me derruba.
Fico feliz por anunciar que hoje, por fim, acabei um capítulo difícil do livro que estou a escrever, O Cavalheiro Inglês de seu título provisório.
YUUUPPPPIIII!!! I'm back!
Resta saber por quanto tempo.
Aqui fica um cheirinho, já sabem que por rever e... bom, sem revelar grande coisa! ;)
Sofia impertigou-se,
com os dedos apertados em torno da chávena de chá, ainda meio cheia. Contou até
dez, depois até vinte, e pousou-a devagar, hesitante. Respirou fundo. Era uma
pena, ia saber-lhe mesmo bem vê-lo a pingar... mas já não era uma menina e não
ia ceder ao impulso! Sabia muitíssimo bem o que dizia, porque, ao contrário
dele, já tinha conversado várias vezes com o rapaz do talho, e também com a
mulher da fruta e fazia, às vezes, perguntas à Fernandinha... e também tinha
ouvido falar do ultimato dos ingleses, por causa de uns territórios em África
e, sim, sabia que D. Carlos e o governo tinham cedido num instante, um mês ou
menos. Falara-se disso por todo o lado, até nas soirées e nos salões de chá, durante muito tempo... ainda se
falava, pelos vistos, apesar de terem passado quase dois anos. Sebastião,
claro, assumira que ela vivia noutro mundo.
- És um palerma da pior
espécie, sabias? – explodiu, fora de si – Um idiota com a mania que é mais
inteligente do que o mundo! Digo-te mais, géniozinho,
não percebo o motivo de ainda haver tanto falatório sobre os ingleses e as
Áfricas... ficam para aí do outro lado do mundo! E já passaram dois anos, Deus
meu!
Sebastião olhou para
ela de boca aberta, e Sofia mordeu o lábio, arrependida de falar sem pensar. Na
sua impulsividade, acabara de comprovar o que Sebastião acabara de dizer, com
certeza, que era uma tonta, perdida nos seus romances de amor. Não era verdade.
Sabia que o reino estava em plena crise, em parte por causa do muito dinheiro
que se afundara lá, na esperança de um retorno que não viera. Podia ser que a culpa
fosse dos britânicos, sim, afinal até na metrópole a indústria era praticamente
dominada pelos estrangeiros. Não era ignorante, lia os jornais!
O
que gostava era de ter alguém cá em casa que conversasse comigo sobre estas
coisas, pensou, desgostosa. Ninguém se lembrava dela, nem o
irmão. Deitou-lhe um olhar aborrecido. Ah!
Se é para o fazer com este ar condescendente, muito obrigada! Faz de propósito
para eu perder a cabeça e dizer disparates.
Ficou a vê-lo pegar na
sobrecasaca e no chapéu, contornar apressadamente o excesso de mobiliário e sair,
ainda a sacudir a cabeça e a resmungar, provavelmente contra a estupidez das
irmãs mais novas. Devia ir afogar as suas mágoas políticas e familiares com os
amigos, ou no colo alvo da noiva.
- Ai, pobre Vina, o que
vais ter que aturar! – exclamou, respirando fundo para afastar os vapores da
raiva.
Deu um passo ou dois em
direção ao canapé, onde os amores e desamores já familiares de Jorge e Berta a
esperavam, e parou. Voltou para trás, hesitante, e ficou a olhar para as letras
negras do periódico, pensando se valeria ou não a pena lê-lo. Não era que não
gostasse de jornais, mesmo os políticos. Eram um pouco como livros, às vezes
mais entusiasmantes, outras vezes menos, mas também os livros eram assim. Os
artigos até eram, em ocasiões, muito bem escritos por gente conhecida, o Eça ou
o Ramalho Ortigão, às vezes o Teófilo. Sorriu. Que diria o irmão, se soubesse
que Sofia lia até ao fim, com muita frequência, as páginas que ele abandonava a
meio? Hoje, porém, sentia-se um pouco distraída, um tanto saudosa da infância,
quando o seu único problema era a eterna neblina de Sintra. Hoje preferia
afundar-se em amores familiares, mesmo desgraçados, mas o irmão tinha-a
irritado, fazendo-a passar por tola.
- Ora bem. Vamos lá ver
o que se passa nesta terra.
Sentou-se onde o irmão
ainda agora estava instalado, e abriu o jornal.
(e aqui acaba o capítulo 1)
3 comentários:
E adorei, Carla! ^_^
Mas já sabes, eu fiquei fã incondicional das tuas histórias!! :P
Que venha daí esse "Cavalheiro Inglês" que só o título (provisório) já me faz sonhar por mais!
Esta Sofia promete ;)
"Ninguém se lembrava dela, nem o irmão" - uma grande frase, um bom exemplo da quantidade de sentimentos que se podem despoletar com palavras tão simples.
Tb eu fico de mau humor quando não escrevo.
Belo capítulo: tomaste-lhe o gosto
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