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sábado, 11 de agosto de 2012

A Grande Mão - excerto 5

  Pensaram um pouco enquanto seguiam, à toa, pelas ruas. A cidade era muito maior do que parecia, maior do que Ich-ar. Com exceção da zona do porto, onde uma larga praça oferecia espaço suficiente para um mercado colorido e luminoso, as ruas estreitas entrelaçavam-se num emaranhado, interrompido aqui a ali por uma praça pequena.
  - É fácil perdermo-nos aqui. – afirmou Patron – Já não faço ideia se vou para Norte ou para Este. Mas acho que por agora ficamos bem, se encontrarmos uma pousada qualquer.
  Os edíficios, de dois e três andares, estavam tão próximos que a luz penetrava com dificuldade. Cheirava mal, a dejetos e a lixo. Para além disso, havia roupa estendida por em muitas janelas, contribuindo para a impressão generalizada de falta de espaço e confusão, e tinham que passar com cuidado para evitar que os quadris dos animais as arrancassem das cordas. Era tão apertado e confuso que, se se afastassem um pouco, ninguém os encontraria. Eirina acabou por concordar, mas avisou:
  - Primeiro, temos que livrar-nos dos cavalos do Corvo, não podemos arranjar alojamento com eles. Saímos da cidade e soltamo-los. Depois regressamos.
  - E o Tinta?
  - o Tinta não está marcado. – relembrou Nolan – Pior são os vossos.
  - Não há nada a fazer. Corremos o risco. – apressou-se Eirina.
Avançaram mais um pouco, viraram à direita, depois à esquerda, e depois Patron parou. Olhou em volta, exasperado. As casas pareciam-lhe todas iguais, todas cinzentas, e todas demasiado altas. Não conseguia encontrar um ponto de referência ali. O odor das porcarias humanas sufocava-o. Olhou para cima, e percebeu que o sol há muito atingira e passara do seu pico. O estômago rugiu de fome.
  - Vamos levar horas para atravessar isto. – queixou-se. 
  - Consegues orientar-te? – perguntou Eirina, dirigindo-se a Nolan. Ele olhou cautelosamente em volta, para as paredes das casas.
  - Não é o meu elemento. Mas talvez consiga. Sigam-me.
  Obedeceram-lhe. Durante bastante tempo percorreram ruas, atravessaram pracetas, contornaram esquinas indistintas. A Patron, parecia-lhe estar sempre no mesmo sítio, mas, aqui e ali, um letreiro apontava uma loja obscura ou uma estalagem, e nunca se repetiam. Nolan estava a conduzi-los para alguma parte, só não sabiam para onde. Continuaram pela tarde fora, até estar tão escuro que era quase impossível distinguir alguma coisa à sua frente. Olhando para cima perceberam que a a luz do dia ainda não se esgotara, mas que se perdia no aglomerado de casas e na estreiteza das ruas.
   - Maldita cidade! – protestou Patron, farto de andar às voltas.
  - Aqui demoro mais.– retorquiu Nolan, franzindo um pouco os olhos – Mas estamos quase, tem paciência.
  Nolan tinha razão. Um pouco adiante, as casas não eram tão altas e respirava-se melhor. Uns metros mais e depararam-se com a muralha espessa que protegia a povoação, feita de blocos sobrepostos, mais altos do que um homem. Seguiram ao longo da parede, na esperança de encontrar alguma porta ou abertura para a floresta por trás. Descobriram uma única, bem guardada. Escondidos por trás de uma esquina, tiveram que esforçar-se por manter quietos os cavalos, que começavam a impacientar‑se com a exíguidade dos espaços e a fome.
  - Procuramos outra? – sussurrou Patron.
  Nolan abanou a cabeça.
  - Não vale a pena. – respondeu. – Estão todas bem defendidas, de certeza. Se, como eu penso, isto é de Torsten, de certeza que ele faz tudo para evitar ser roubado.
  - Como é que fazemos?
  Dois soldados de uniforme vermelho caminhavam para trás e para diante em frente de um portão aberto. Eirina observou-os e as ruas em seu redor. Era um ponto bastante isolado, não se via ninguém.
  - Tenho uma ideia do que podemos fazer.
  Ouviram-na com atenção enquanto explicava o seu plano.
  - Arriscado. – comentou Patron, no fim.
  - Têm outro? – perguntou ela, irritada. – Estamos a perder tempo. Se querem dormir numa cama esta noite te...
  - E como é que voltamos a entrar? – interrompeu Nolan.
  Ficaram a olhar uns para os outros. Podiam escapulir-se pelo portão de volta à cidade, mas não com o Tinta  e as outras duas montadas pela rédea.
  - Tens a certeza de que consegues orientar-te e voltar a entrar?
  - Sem dúvida.
  - Então tu ficas com os nossos cavalos aqui, Patron. Eu e Nolan tratamos disto. ordenou Eirina, e desapareceu sozinha na esquina seguinte.
  Nolan montou um dos cavalos dos Corvos que tencionavam soltar, tomou as rédeas dos outros e esperou. Patron, recuou um pouco mais para a sombra da rua com os três cavalos. Daí a segundos, os gritos desesperados de uma mulher cortaram o ar, e os dois jovens sorriram. Os soldados entreolharam-se, mas não hesitaram mais de um segundo antes de se precipitarem em direção à gritaria. Imaginaram Eirina berrando como uma louca, mais adiante, fugindo depois pela rua abaixo e enfiando-se numa portada, para estar bem escondida quando os dois guardas aparecessem. Nolan puxou as rédeas e lançou-se num trote rápido, depois num galope veloz pelo portão, agora sem vigilância, até desaparecer nas árvores por trás dele. Avançou um ou dois quilómetros pela floresta, para abandonar os cavalos livres de sela, coberta ou arreios, nalgum lugar onde pudessem sobreviver, antes de regressar e tentar descobrir uma forma de voltar a entrar. Patron encolheu-se entre os cavalos inquietos, sentindo-se sozinho. Sabia muito bem que ia ter que esperar, e rezar para que ambos os seus amigos estivessem bem.
pag 244-45

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