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sexta-feira, 28 de outubro de 2016

recuso a boca negra do abismo

Creio que trago todas as escuridões
em desconcertadas folhas sobrepostas,
dançam como lençois de viúva em sacadas estreitas.
Conheço bem as raízes anciãs das suas histórias,
rasgadas à bruta de velhos diários.
Era outra essa que ficou na tinta,
talvez por isso recuso a boca negra do abismo.
Nada nela me surpreende ou choca.
Nada me seduz na certeza de um vazio opaco.
Do outro lado há o brilho simples
da luz branca da manhã, eterna cada manhã
no dom de se repetir sempre diferente.
Sacudo das asas o orvalho escuro
mesmo plumas de chumbo hão de voar,
viro para o sol os olhos, e com eles a alma,
se alma há em preferir um raio de sol
encontro beleza num fôlego apenas,
depois em tudo, na linha de água e no asfalto,
no abraço de fogo do Outono às árvores
no cansaço dos dias das noites dos dias das noites
nas telas que se pintam com tintas e palavras
e imagens e sons e gestos e silêncios






1 comentário:

António Silva disse...

É um cliché mas não adianta negar a escuridão. O melhor é domá-la e usar em nosso proveito quando a vida assim o exige. Escrever ajuda!