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quinta-feira, 30 de julho de 2015

The Rosie Project, de Simsion Graeme. É o Sheldon, ou quase!

A personagem principal de The Rosie Project não se chama Sheldon. Para quem vê The Big Bang Theory, porém, é impossível não ver o terrível(mente divertido) Sheldon no protagonista deste romance levezinho, que me arrancou muitas gargalhadas. Para quem vê a série, está quase tudo dito. Para quem não vê, passo a explicar.  

A personagem chama-se Don, tem 39 anos e algo semelhante a um sindroma de Asperger, completo com uma inteligência muito acima da média, uma interpretação literal e direta do mundo à sua volta e uma honestidade brutal que não advém de valores morais, mas da incapacidade de entender a "mentira branca" ou a maioria das nuances da interação com os outros seres humanos ou das regras sociais. É desprovido de vaidade, mas mostra uma arrogância que advém de uma auto-estima muito saudável, da  visão preto e branco do mundo e da dificuldade em entender a perspectiva dos outros ou o despropósito da suas inflexibilidade. É um cientista, claro, como poderia ser outra coisa? Neste caso, um geneticista. 

A questão é que este Sheldon... Don, chama-se Don, tem alguma vontade de encetar um relacionamento com uma mulher, casar, mas as suas tentativas são, como se pode imaginar, um desastre. Decide, portanto, que  o ideal será organizar um questionário (completíssimo e totalmente absurdo para o comum dos humanos) que determinará a companheira ideal. Não precisa de foto, porque o seu aspecto é irrelevante. Aparece-lhe Rosie, que ele pensa ter respondido ao inquérito. Apanha-a de surpresa convidando-a para jantar, diverte-se apesar da rapariga se mostrar o completo oposto do que ele pretendia, ela pede-lhe um favor relativo ao seu trabalho como geneticista... e por aqui me fico! Esta é a parte do romance, que está engraçada, etc, etc, e não quero estragar.

Ao que interessa. O tema devia ser sério. Sei bem que o mundo pode ser um lugar difícil para quem tem esta problemática e para as suas famílias. Este sindroma conduz a comportamentos quase obsessivos, Don tem um horário inflexível, contado ao minuto, uma ementa semanal que nunca varia, etc, e anti-sociais. Talvez não devesse ser tratado com tanta leveza, ser pretexto e centro de um romance de amor, mas não fui capaz de não gostar. O livro não ofende nem procura soluções, é apenas um romance de amor muito brincalhão e a forma como está escrito... ri-me muito. Subverte o tal tema pesado, apresentando a história do ponto de vista do protagonista, e cria uma leitura divertida. Não pretende outra coisa, não é nenhum tratado nem uma aproximação séria ao tema. Não têm sempre de ser.

Teria muitas dúvidas de que um homem com esta problemática fosse capaz das mudanças a que se propõe e leva a cabo, e aqui vou seguir o exemplo de Don, que elabora listas engraçadíssimas e lógicas para chegar às conclusões de que necessita:

  • se elas não estivessem justificadas, através ds raciocínios lógicos da personagem, surgindo de forma natural (para ele e no enredo). Usa aliás, uma espécie de listagem para concluir que está apaixonado... hilariante.
  • se a personagem não tivesse mantido a integridade, que manteve: ele não mudou, o que mudou foram alguns dos seus hábitos. 
  • se eu não tivesse tido este ano um aluno com Asperger que no ano passado nem ia às aulas e este ano vi evoluir, tanto no trabalho, como no relacionamento com os colegas de forma muito positiva. Tive o prazer de vê-lo participar nas aulas de forma quase normal... isto é, levantando muito discretamente a mão e falando sempre com a voz a tremer e baixinho, mas de forma voluntária e respondendo sempre que solicitado, Tive mais prazer ainda em vê-lo sorrir que coisas que iam acontecendo e em "ralhar" com ele e a colega do lado por estarem na conversa - fi-lo sem convicção, porque considerei um progresso relevante e saudável para ele! 

Posto isto, ri-me muito com os seus racíocinios, exigências, peripécias e dificuldades com as regras sociais, mas sobretudo com a sua reação a elas e a forma como encarou e resolveu os problemas e encarou os "desafios" (por exemplo, o tremendo desafio de assistir a um jogo de futebol americano, para o qual se preparou estudando as regras na internet...). Nestas circunstâncias, a história de amor propriamente dita nunca poderia ser lamechas... é, pelo contrário, bastante divertida, porque a vemos pelos olhos dele, nós sabemos que há ali uma história de amor, mas ele não. Só consegui sacudir parcialmente o Sheldon da personagem a muito mais de meio, mas nunca completamente, porque, embora tenham enormes diferenças, os racíocinios lógicos, cientificos, e as interpretações totalmente literais são semelhantes. Há muito humor nesta ausência de humor.

E apreciei a leveza, que foi ideal para a circunstância em que eu própria me encontrava: num parque temático, a ocupat-me com a leitura enquanto a família estava de cabeça para baixo e/ou a alturas estúpidas. 

1 comentário:

Jardim de Mil Histórias disse...

Olá Carla,
Gostei muito da opinião do livro. Desde que conheço este livro que tenho curiosidade em o ler. Parece interessante.
Beijinhos e boas leituras