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sexta-feira, 3 de julho de 2015

As Cidades Invisíveis, de Italo Calvino, ou as maravilhosas palavras insuficientes

Pegar neste livro sem saber ao que se vai, sem conhecer opiniões, sinopses ou ter lido ainda o autor, foi para mim a forma perfeita de pegar nele. Terminado, e em muito pouco tempo, posso afiançar que é dos poucos livros que certamente voltarei a ler e que não é um romance, nem um livro de contos. 

As supostas viagens de Marco Polo e suas narrações a Kublai Khan são o pretexto, a meu ver irrelevante, a não ser no que ambos têm de sonho - o grande viajante, que nada tem mas tudo viu, e o grande imperador a quem todas as cidades pertencem, mas que as conhece apenas na imaginação. E é de imaginação que o livro é feito. Seria uma espécie de roteiro de viagem, se estas cidades existissem tal como as descreve. Não existem, porque nunca existiram ou porque o livro nos traz precisamente a desconstrução delas - cada cidade é a cidade vista ou imaginada, em toda a sua pujança e exotismo, em todas as coisas físicas e as outras, mas é também a que se percebe nos insterstícios, e também essa se entende - ou nunca pode entender-se - em toda a sua pujança e exotismo, em todas as coisas físicas e as outras. 

Esta é uma viagem pelo Homem, porque as cidades são construções e espaços do Homem e são, por isso, o próprio Homem. São múltiplas, cada uma contendo todos os seus passados e todos os seus futuros, todas as coisas vistas e as invísiveis, mas também, como o Homem, todas as suas possibilidades: os caminhos que não se seguiram, as promessas quebradas, todas as coisas que podiam ter sido e não foram.

É também uma viagem pela palavra e pelas possibilidades e imperfeições da comunicação. Tantas vezes se repete que a cidade descrita não corresponde - de todo, ou por inteiro - nem à cidade que existe, nem à que se imaginou, e todavia são as palavras, falhas e insuficentes como são para trazer o que não é descritível, que nos trazem as muitas e muitas possibilidades da imaginação.

A escrita é complexa e encantantória, tanto que não fui capaz de parar, mesmo quando sentia que os textos precisavam de ser relidos. Desconfio que voltarei a lê-los muitas e muitas e muitas vezes, para também eu descobrir novas coisas em cada uma das cidades. Li a eito desta vez, mas da próxima, talvez escolha ler primeiro todas "As Cidades e a Memória", ou todas "As Cidades Subtis" ou todas "As Cidades e o Desejo", etc. São cinco de cada e tenho vontade de descobrir se, lidas em conjunto, me trazem algo de novo... O que digo? O livro há de trazer-me algo de novo de cada vez que o ler. Da próxima, por exemplo, svou usufruir mais dos primeiros textos, lidos em fase de adaptação à escrita e à intenção. Para já, atrever-me-ia, assim de repente, a dizer que as minhas favoritas estão entre "As Cidades Ocultas". 

Uma nota para a capa, que traz um dos meus quadros favoritos, a Torre de Babel, de Pieter Brueghel. Uma maravilha este quadro que podia muito bem constar de "As Cidades e os Sinais".

1 comentário:

Márcia Balsas disse...

Obrigada Carla, por me deixares ainda com mais vontade de ler este livro. :)