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sábado, 5 de julho de 2014

The Rules of Attraction - Bret Easton Ellis


(não é esta a minha versão, mas deixem lá... a minha
capa é igualmente horrenda) 
Dei por mim durante a leitura deste livro a pensar que, mesmo quando vivemos com outra pessoa um acontecimento, não vivemos o mesmo acontecimento. Que o que eu vejo não é nunca o mesmo que vê o outro, mesmo que se esteja a olhar para o mesmo objecto, a mesma pessoa, a mesma coisa. Não é , infelizmente, nenhuma conclusão genial, é apenas o óbvio - é o que faz com que não gostemos todos de amarelo, e que eu aprecie um objecto artístico que a pessoa ao meu lado detesta. A valorização, apreciação, compreensão do que vemos é mediada pela nossa sensibilidade e bagagem, tanto emocional como cultural. O que se aplica à arte, aplica-se à vida também.

Neste livro é levado ao extremo. Ellis escreve uma manta de retalhos de relatos na primeira pessoa, vozes intercaladas relatando acontecimentos supostamente comuns, as mesmas festas, as mesmas bebedeiras e pedradas, as mesmas noitadas de sexo, as mesmas relações falhadas, as mesmas conversas. O que nos é contado, porém, é por vezes tão divergente que duvidamos que não existam dois Seans, dois Pauls, duas Laurens... E, no entanto, é feito com mestria suficiente para, no meio do vazio moral e emocional e por vezes intelectual destes supostos alunos de Arte, as vozes se identifiquem com clareza e cada um assuma uma personalidade que, no final do livro, conseguimos absorver. Não são todas personagens adoráveis nem é fácil encontrar razão ou valor nas suas acções, mas, no seu conjunto, compõe o retrato de uma geração de jovens adultos da era Regan, entediados, sem esperança nem interesse pelo que os rodeia ou por si próprios. Nesse aspecto, é um livro datado, pejado de referências que, para mim, que tinha já 14 anos em 1985, são facilmente identificáveis, e de um espírito que reconheço como sendo o de uma certa época e de uma certa perspectiva da sociedade e do ser humano, dura, por vezes com certa ternura mas sem nenhuma esperança. Despondent, diria. 

O livro está muitíssimo bem escrito e, embora me tenha visto por vezes irritada com outra noitada - ou manhã, ou tarde - de excesso, bebedeira, pedra e sexo muitas vezes sem desejo, tudo isto por não haver mais nada para fazer, por estar entediado, porque se está ali ou porque sim, li todo o livro com um prazer enorme. Muitas vezes divertida com a ironia nas diferentes perspectivas - como por exemplo, um ver paixão nos olhos de outro que mal lhe conhece o nome e nem sabe muito bem porque dormiu com ele. Ou um achar que todos os gestos de outro (isto entre dois rapazes) são de timidez, quando o outro tem que beber até cair para suportar a relação... Também li com tristeza. Porque tudo isto é também triste. O vazio entristece, sobretudo em gente tão jovem. 

Uma nota para a ironia do título: não há regra. Para nada, menos ainda para a atração. E amor menos ainda. Nem limites. Também não há amor ou, parece-me, amizade. Nem sentido para as coisas. E não se conhece ninguém. "Ninguém conhece verdadeiramente ninguém.", dizem as personagens no livro. Nisso, creio, têm razão.

Outra nota para as muitas referências no texto, literárias, artísticas e musicais. Sorri muitas vezes com as canções e bandas mencionadas, que reconheci da minha adolescência, Talking Heads, REM, Deff Leppard, Elvis Costello, Cure... tantas e tantas outras!

Há filme, mas não sei se quero ver. Fica o trailer.


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