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terça-feira, 12 de novembro de 2013

E se eu quiser escrever outro livro?

Em conversa recente com... acho que foi com a Ana Ferreira, do Illusionary Pleasure, com quem falo muitas vezes sobre questões de escrita, sou uma melga, surgiu muito brevemente uma questão na qual tenho pensado bastante. 

Quando comecei a escrever, aventurei-me antes de mais pela fantasia. Lia-a muito, era o meu género favorito e ainda gosto bastante. Os meus primeiros ratos de gaveta foram desse género, histórias imperfeitas que de vez em quando espreitam e me pedem que lhes dê um jeitinho. Algumas, já as expus à luz crua do dia e à luz ainda mais crua da leitura de outros. Resguardei a primeira, o meu primeiro amor, A Dama do Rio, que teve um e só um leitor, na altura com uns dezasseis anos. Ele adorou, mas é livro para precisar de muito, muito trabalho.

Depois de várias experiências na low-fantasy, na fantasia urbana / romance paranormal, etc, escrevi o Alma Rebelde, que quem por aqui anda sabe que interessou a Porto Editora e foi publicado. Que outros filhos nascerão desta relação autor-editora, não sei. O que sei é que depois do Alma não escrevi mais fantasia, escrevi outro romance de época e um que oscila entre o contemporâneo e outra época. Ambos em Lisboa, ambos histórias de que gosto muito e que, embora vá recusar sempre o rótulo de romance histórico, coisa de mais fôlego, exigiram bastante pesquisa. Continuam a ser histórias imperfeitas. Um dia chego lá. 

Nestes livros todos, e já foram muitos, a "voz" é evidentemente a mesma. É a minha, parece que se reconhece e isso é bom. Deve ser o tom, o vocabulário e, possivelmente, algo que passa nas personagens e que me é intrínseco. Há coisas que, em maior ou menos grau, estão lá, porque gosto delas nos livros (nos que leio, nos que escrevo). Há gente que cresce e se define, há mulheres que procuram o seu lugar, há muitas vezes amor. Outras coisas. 

A questão é que, depois de ter deixado de escrever fantasia (tenho revisto muito, mas não sei se estas revisões conseguiram tranformar textos toscos em alguma coisa que se possa ler, já que parece que a capacidade para as obras primas me escapa), me apetece de repente voltar lá. Escrever uma distopia, o que nunca fiz. Ou esperimentar um romance exclusivamente contemporâneo. Dar um twist ao meu tom. Experimentar. E não sei se devo. Mais cedo ou mais tarde tenho que encontrar o meu nicho e aninhar-me lá, e deixar de ser razoável num mundo de coisas, para me aperfeiçoar numa só. Ou não?  

Que caminho é o meu, afinal? Serei capaz de escrever essencialmente o mesmo género? O romance de época vem-me com facilidade, como verifiquei recentemente, ao escrever O Cavalheiro Inglês, que pode nunca ser publicado, mas é um livro giro e, apesar da pesquisa,não me custou nada a escrever. Ou, como experimentei no Chama (vai ter outro nome e uma publicação pela PE que não é bem a que eu desejava, mas é uma aventura), poderei ser mais contemporânea? Abandono a fantasia? Andam por aí o Mão, que lá vai sendo lido aos poucos e, admito, ainda precisa de muito trabalho, e o Besta, que vai tentar a sua... a minha sorte noutras editoras e, quando for recusado, pode oferecer-me a resposta de que preciso.

É um dilema, porque começo a cansar-me de rever, e a ter vontade de lançar-me noutro livro. Tenho uma intriga na época das descobertas semi-planeada... mas apetece-me? Não sei. Se deixar fluir uma história, é capaz de me surgir um desses romances inconsequentes, que me deixe a alma mais leve nesta altura de pouco, pouquíssimo ânimo. 


8 comentários:

Ivonne Zuzarte disse...

Ultimamente, os escritores têm estado muito em baixo. Que se passa? Ou se calhar sou eu que me tenho apercebido mais disso... Ou vocês que se têm exposto mais (e acho bem, porque isto de sofrer sozinho não dá com nadinha de nada)...

Ânimo!
Quanto à capa do Besta, o raparinho mudou (isto é apenas uma opinião pessoal, prefiro o rapaziho moreno de olho azul :O, loiro destoa um bocadinho com o tom escuro, mas claro que a personagem for loura... :P aiaiai é difícil agradar a todos, eu sei! Mas atenção, eu aprovo os loiros :D )

Ana Luiz disse...

Li com atenção as suas preocupações, e se me permite, dir-lhe-ia que são falsas questões. Os rótulos são para nos serem colocados pelos outros, que deles precisam para nos arrumarem nas suas "prateleiras". E fazem-no com tudo, não só com livros e autores...
Não me parece que um autor se deva auto-rotular, uma vez que isso significaria apenas uma coisa: delimitar fronteiras, limites. E para a imaginação de um autor e para a sua vontade de criar, não deverão existir tais barreiras.
Na minha opinião existem dois caminhos a seguir, e que não são se excluem mutuamente...ou pelo menos não necessariamente.
1. Escrever aquilo que está mais "in", que suscita mais interesse nos leitores enquanto "massa"... aquilo que vende. Mundos fantásticos, Vampiros e Erotismo são exemplos recentes destas tendências... Se já gosta de escrever sobre estas coisas, e se pretende ver a sua arte retribuida monetariamente, sugiro que aproveite essas tendências.
2. Escrever aquilo que lhe apetece, como e quando lhe apetece, e apenas porque lhe apetece... Se quer de facto encontrar um voz apenas sua, acho que é pela descoberta deste caminho que a encontrará. É claro que se optar apenas pelo número dois corre o risco de só ser descoberta após a sua morte ou nunca... :) Estou a brincar, mas acho que entenderá onde quero chegar.

Carla M. Soares disse...

Visto sobre essa perspectiva da auto-rotulação, a Ana poderá ter razão, também não concordo que um autor se deva auto-rotular, nem saberia como fazê-lo. Mas não será bem essa a questão aqui, a de encontrar um rótulo. Uma orientção, talvez, para o meu trabalho no futuro. Nada é simples ou linear, feliz ou infelizmente e, num momento de pausa, quando se têm vontades contraditórias (uma das quais parar de vez)a questão é pertinente.

Não me vejo capaz de escrever alguma coisa só porque está "in", ou provavelmente acabaria por escrever literatura erótica, que parece que é o último grito. Escrevo sempre o que me apetece, quer isso coincida ou não com a moda. Duvido que venha a ter grande retribuição monetrário, e mais ainda que venha a ter grande reconhecimento ou a escrever grande literatura.
Ganharia mais em termos de qualidade das histórias, dos textos, se me concentrasse mais num género? Talvez. Serei capaz de abandonar inteiramente o fantástico, embora sinta que, de certa forma, o ultrapassei? Duvido. Tenho dúvidas ? Sim. É mais por aí, seja a questão falsa ou não. A dúvida é genuína.

Ivonne, alguns autores estão em baixo, sim, com uma certa razão para isso. Não vou dissertar mais sobre oportunidades, etc, porque corro o risco de parecer uma choramingas, e não é isso, mas há questões de fundo que me têm confundido, como o discurso do "sabemos que é bom, gostamos mesmo, mesmo, mas..." Antes me dissessem que era mau e não valia a pena, pelo menos sabia o que fazer: parar de vez.

Anónimo disse...

anda um vírus à solta: o escritor tristonho. fora de brincadeira, diria que começa a ser comum encontrar gente que vê na escrita o seu caminho (e não digo que seja obrigatoriamente um caminho "profissional"), que encontra a certa altura alguém que lhe vislumbra algum talento ou mérito na escrita, mas que depois tem de confrontar-se com a inconsequência do que conseguiu publicar. é muito difícil ouvir aquilo que a Carla descreveu: gostamos do novo livro mas não o vamos publicar por razões de mercado, vendas, crise. fica-se um pouco sem rede, desorientado, numa dúvida constante de se vale a pena continuar a escrever. e isso, dado que a escrita se tornou um factor de equilíbrio individual, acaba por tornar-se uma obsessão adolescente, apaixonada, visceral, que tem saído cá para fora em textos que tentam expiar o mal-estar.

sobre o estilo, também tenho pensado muito sobre isso. não sei bem se já encontrei uma voz, até porque o Revolução Paraíso é um livro à parte do resto que já escrevi. mas esse resto, não tem leitores para validar a tal voz. o que não me vejo a fazer é repetir "cenários". os livros que tenho na cabeça são todos em períodos e/ou geografias diferentes. agora se isso é bom ou mau... a verdade é que tudo o que tem grande sucesso parece ter uma especialização temática. talvez se quisermos fugir a isso possam ser as nossas personagens a forjar a nossa voz, mesmo que "aplicadas" em contextos diferentes.

curioso: o livro que devia seguir o Revolução Paraíso é uma distopia. :)

Inês Montenegro disse...

Se entendi bem, a questão fulcral é se um autor se deve manter apenas num género em que sabe que é bom, ou arriscar e tentar outros, certo?
Eu vou pelo arriscar. Claro que há autores que são muito bons num género e medianos ou mesmo maus noutros (Agatha Christie, adoro-te, mas estou a olhar para ti), mas encontro muitos mais exemplos de autores versáteis - assim de repente, vem-me o Ken Follet à cabeça, que escreve tanto romance histórico como thrillers, e se dá muito bem com ambos. Não vejo razões para que um autor não arrisque e não trabalhe nesse sentido.
E numa nota pessoal, ficarei com grande pena se O Cavalheiro Inglês não for publicado =( Eu quero-o na minha estante.

Carla M. Soares disse...

Acho que ninguém gostaria mais do que de dizer-te que op vais ter na estante, Inês, mas, se me mantiver na PE, seria mais provavel que o viesse a ter num ereader. Isso aborrece-me? Sim.

Percebeste muito bem a questão. Manter-me num género, experimentar... provavelmente vou sempre oscilar e tentar, e vamos lá ver se um dia me torno "mestre" nalguma coisa. ;)

Olinda Gil disse...

Pelo que me apercebi só escreves dois géneros: narrativa e poesia. E parece-me que tens mais amor à tua narrativa.

Se é fantasia, contemporâneo, de época, são só roupagens da narrativa. Gosto muito do que escreves, li montes de coisas tuas e acho que todas elas deviam ser publicadas (para recordar li, para além do Alma, o Cavaleiro, o Chama, a Besta e a Mão). Claro que estes teus textos não se irão enquandrar todos na linha editorial de uma só editora. Arrisca, envia para mais.

Há uns dois dias dei comigo a recordar-me da Mão. Acho que já te disse, há ali qualquer coisa de primordial que me puxa para esse mundo.

Experimenta o dito contemporâneo (um nome tão fugaz seja para o que for...), só para saber como te sentes.

Silvana disse...

Olá Carla,
Li com atenção aquilo que escreveste... Não tenho muito conhecimento de causa em relação ao teu trabalho, uma vez que até ao momento só li um livro teu e foi como Beta. E o que vou acompanho aqui no blog. Mas pretendo ler outros, claro :).

Compreendo que os tempos não sejam animadores. Mas a escrita é um prazer para ti, certo? Então porque é que deves limitar-te a alguma coisa? Escreve sobre aquilo que gostas, deixa as palavras fluírem!

Só me resta deixar-te o meu apoio e ajudar-te a dar um empurrãozinho ao desânimo... Beijinhos e boa escrita ;)