e a salinha onde Sofia prefere estar...
Revendo, vou encontrando estas coisas... que trapalhada de sala, nada como a imagem maravilhosa!
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A
casa de Lisboa, que fora dos pais no início do casamento e à qual tinham
regressado depois de tantos anos, estava cheia dos restos da sua vida. Tinha
uma excelente localização, muito perto do Jardim da Estrela, era elegante e
confortável, mas as três salas, uma convertida em escritório para o pai, e os quatro
quartos eram insignificantes, quando comparados com as dimensões do chalet. As coisas sem as quais a mãe
“não podia viver”, somadas às que realmente tinha sido necessário trazer, e ao
que já existia na casa, tinham-na deixado atravancada, ao ponto de parecer que,
por excesso decorativo, podia explodir a qualquer momento. Naquela salinha,
mais pequena do que o seu quarto em Sintra, estavam objectos novos e antigos,
amontoados sem nexo nem ordem. Nada dava com nada. A mãe mandara ali enfiar as
três mesinhas pé-de-galo do estúdio do pai, muito antigas, e o canapé de veludo
azul da sala dos bordados. Chocava violentamente com os tons granada e verde do
cadeirão antiquado, que já lá estava e não podia ser reformado porque “era o
favorito da avó”. Também havia a credência de estilo oriental que, em Sintra,
costumava enfeitar o átrio dos quartos, com o seu horrível tampo em mármore verde
e os embutidos dourados, e uma meia dúzia de candeeiros de diferentes tamanhos
e formatos provenientes de diferentes épocas e partes do chalet. Nas estantes, as pequenas peças de prata, de madrepérola ou
de madeira, caixinhas, cinzeiros e outras coisinhas sem propósito, tomavam o
lugar dos seus preciosos livros. E as paredes! As paredes! Mal se via o brocado
acetinado que as revestia, cobertas como estavam com uma multitude de quadros,
de estilos tão diversos que incluiam uma Josefa de Óbidos e um Silva Porto, um
Turner valioso, o favorito de Sofia, e uma dúzia de retratos de antepassados da
família, metade dos quais, na sua opinião, nunca deveriam ter-se deixado
retratar.
Não admira que a mãe nunca cá entre,
considerou. Isto é uma sala de arrumos!
Por vezes, até Sofia se sentia confusa lá dentro, embora, na verdade, fosse a
sua divisão preferida, com o sol a entrar a rodos a refletir-se na profusão
desorganizada de cores e brilhos. Quando ali estava, sentia-se num mundo
aparte, mágico, sem o terrível espartilho das regras pelas quais vivia todas as
outras horas da sua vida.
(O Cavalheiro Inglês, em revisão)
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