Páginas

sábado, 19 de outubro de 2013

Como é que faço isto sem corar?


Aproximo-me sempre com tremenda relutância da escrita de cenas de sexo. Ainda mais da sua revisão. 


Quando escrevo, deixo andar, sem grande preocupação de equilíbrio, tentando apenas que a coisa não se torne... enfim, pornográfica, no sentido negativo da palavra. Não chamo os bois pelos nomes, mas tento que se perceba que são bois. Grandes bois. Ou touros. Tento torná-las densas, suadas, cheias de toque e pele, como elas devem ser, imperfeitas e perfeitas ao mesmo tempo. E avanço.

Pior é quando chega a hora da revisão, e eu leio e penso: ai, ai, escrevi mesmo isto? Tenho coragem de ter isto com o meu nome? TENHO, pois claro, mas eu, que nem coro, fico coradinha. 

E vem a preocupação: há elegância nisto? Deve haver? Vejo muitas vezes o erótico escrito com termos que não me choca ler, mas que me deixariam a morrer de vergonha se os escrevesse: não seria eu. O erotismo soft, mas all the way, não acredito em meias cenas, é mais a minha praia, não vale a pena tentar fazer de outra forma. E seria assim se um dia escrevesse um erótico - erótico não é pornográfico - que não vou escrever. 
(uma notinha: all the way quando faz sentido. Repetir destas cenas a torto e a direito, completas, atirava o livro para o erótico que, como disse, não vou escrever)

Um exemplo. 

"Obedeci,  e a gota de sangue do seu lábio inferior brincou na minha boca e na dela, entre as nossas línguas, enquanto nos beijávamos. Eu estava perigosamente perto de me deixar levar outra vez para uma deliciosa inconsciência. Camila enrolou os dedos no meu cabelo e fixou‑me ali. A sua respiração tornou-se mais curta e irregular, entrecortada pelos sons inconfundíveis do amor. O meu cuidadoso auto-controle desfazia-se um pouco mais, sempre que o corpo quente debaixo de mim se agitava, o mais básico desejo a tomar conta dos meus gestos, dos dela também. Ofegava e suspirava e murmurava palavras incompreensíveis. Os seus arrepios eram de prazer. Instintivamente, afastei‑lhe as coxas com os joelhos e voltei a deitar-me entre elas, e ela envolveu-me com as longas pernas e puxou-me para si. Continuei a morder, nos pulsos, nas curvas suaves dos braços e no pescoço, e a mover-me."

- Então e o resto? - pergunta o leitor, indignado - Isto nem dá para saber se vale a pena! 
- Pois, - respondo eu - está nas páginas do livro que pode nunca ser publicado. E eu nem sei o que pensar dele.

3 comentários:

Fernanda disse...

Estava a gostar! para quando mais um "sneak a peek" da historia? :)

Maria João disse...

isto não é justo :)

Cláudia disse...

Sabes o que pensar dele, sabes! Está giro, tiveste várias opiniões positivas, agora é não perder o comboio :)