Páginas

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

A Caixa - Günter Grass

Opinião:
Já há muito tempo que este livro do Nobel Ghunter Grass aguardava na minha estante pela vontade de lê-lo. Foi comprado num pack  com O Gato e o Rato, provavelmente no ano em que ganhou o Nobel. 

 
Este livro é aparentemente de carácter (auto)biográfico. Os filhos, oito de quatro mães, juntam-se algumas vezes para conversar sobre o pai e, claro, sobre a sua vida familiar, fazendo deste livro um longo diálogo. Percebi, quase no fim, que o faziam a pedido do pai, gravando as conversas para dar depois lugar a um livro. Como pretexto, uma máquina fotográfica, uma Agfa-Spezial em formato de caixa - suponho que a da capa desta edição e sem dúvida a que dá origem ao título - e as fotos que com ela uma personagem exterior e ao mesmo tempo interior à família produz. Algumas reais. Outras fantásticas, mostrando partes do passado e do futuro que servem como revalações históricas e familiares. Esta é uma Caixa de memórias, mas também uma caixa mágica de coisas que foram, coisas que serão e coisas que se gostaria que tivessem sido.
 
Não sei até que ponte vai a biografia, porque não faço ideia que partes do livro correspondem à realidade, se todas, nenhuma, algumas... Todas não serão, há uma componente obviamente fantástica no conteúdo das fotos, associada em geral ao imaginário infantil. Mas também não sei se os vários encontros entre os filhos se deram ou se o autor os imaginou, simulando conversas entre eles para ir narrando os factos; nem sei se estes 'factos' das diferentes vidas, de pai e filhos, são reais ou manipulados pelo autor. A existirem, apontam um homem um pouco egocêntrico que teve várias mulheres, por vezes ao mesmo tempo, que esteve envolvido na política (isso sabe-se que é verdade), e que se dedicou de forma irregular à imagem, pareceu-me que gravura e talvez escultura, e à escrita - curioso como os filhos se vão referindo aos diferentes livros, aquele grosso, o fininho, o outro sobre cães, ou gatos, o da ratazana... não conheço os livros dele, pelo que demorei um pouco a compreender algumas alusões.
 
A narração não é de maneira nenhuma linear, o que torna mais difícil acompanhar a história. Sendo um diálogo permanente, não estão identificados os filhos que tomam de repente a palavra, que interrompem, que fazem referências paralelas... Sabemos quem começa, de quem é "a vez" de falar, mas depois disso nem sempre se sabe quem diz o quê. Faz-se parágrafo, salta-se de personagem, sem qualquer introdução. De início é confuso, porque ainda não estabelecemos devidamente as relações entre eles. Mais para diante, às vezes já é possível perceber quem se 'mete' de repente na conversa, se as falas são lmais ongas, ou há alguma referência específica a lugares, situações... noutros casos, desisti de tentar saber. Limitei-me a seguir na confusão.
 
No meio disto tudo, o surpreendente é que pega-se no livro e, quando se dá conta, leram-se 20, 30, 50 páginas, e sem frete nenhum apesar da confusão. A estrutura é confusa, mas a linguagem é fluida e sem arabescos, familiar. Não decorei todos os nomes, mas depois de tudo fiquei com uma boa ideia da dinâmica desta família estranha (ou talvez apenas muito variada) ao longo do tempo e do percurso das diferentes vidas, como se aproximam e se afastam, se entretecem, com Mariechen e a sua Agfa-Box'ped'um'desejo como âncora e elemento omnipresente. Tem-se a impressão de cordialidade entre os irmãos. E, mesmo com uma cronologia hesitante, também da vida de Ghunter e da pessoa que ele é.  
 
Vou ler O Gato e o Rato um dia destes. Tenho curiosidade em saber se este é o estilo do autor, ou se ouve uma escolha deste formato de diálogo sem identicação de intervenientes para este livro em particular. Gostei, mas não sei se gostaria que fossem todos assim.
 
Sinopse:
A Caixa é uma obra quase tão polémica como Descascando a Cebola, a primeira autobiografia em que Günter Grass tomou a decisão de contar em pormenor o seu passado nas SS hitlerianas quando tinha 17 anos. As revelações agora libertam-se do campo político e voltam-se para o seu universo familiar. A Caixa reproduz várias conversas gravadas pelos oito filhos do autor - às vezes todos juntos, outras vezes sozinhos - que recordam a sua infância e juventude, bem como as mudanças de casa e as relações amorosas do pai. O livro conta a vida do escritor a partir do momento em que Descascando a Cebola havia parado, ou seja, 1959 e é uma mistura de ficção e realidade. Narra as suas relações familiares num desafio feroz e, por vezes, expressa a ternura, a crítica, a indiferença… todos os sentimentos que se reflectem na relação do escritor com os filhos. O título é uma referência a uma máquina fotográfica antiga da Agfa, fabricada em formato de caixa. É o símbolo central da história, pois é com ela que a personagem principal, Maria, fotografa o quotidiano desta família. Uma máquina que sobreviveu á guerra e aos incêndios de Berlim e que, de algum modo, adquiriu a faculdade de avançar e retroceder no tempo. A Caixa é um retrato em sépia da memória de um passado que não dá descanso ao escritor.
 

Sem comentários: